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A influência francesa na cidade de São Paulo, no final do século XIX e século XX parte 2

A influência francesa na cidade de São Paulo, no final do século XIX e século XX – parte 2

        

 

Crescimento desordenado

De 1872 a 1912, desenvolve-se o chamado ciclo da borracha, uma fase muito expressiva da história econômica brasileira. Durante esse período Belém e Manaus despontam como cidades desenvolvidas e prósperas e contam com um sistema de água encanada e esgoto. Em Manaus há edifícios imponentes como o Teatro Amazonas, o Palácio do Governo, o Mercado Municipal e o prédio da Alfândega.

                                                                                   

Teatro de Manaus

Belém, conhecida como Petit Paris surge como uma metrópole perdida na selva. Como exemplo de seu poderio, é a primeira cidade do país a receber luz elétrica.

Nessa época, a capital do Pará responde por cerca de 40% de toda a exportação brasileira.

Por volta de 1912, a cotação internacional da borracha passa a registrar quedas constantes e preocupantes. O Rio de Janeiro, a então capital federal, inicia o século XX ao som da marchinha de carnaval O Abre Alas de Chiquinha Gonzaga. Os cariocas não a cantam somente em português, muitos a cantarolam em francês, graças às aulas gratuitas oferecidas pela Aliança Francesa.

Chiquinha Gonzaga

Na virada do século XIX para o XX, há um claro rompimento com o estilo neoclássico. A França, representada principalmente, pela École de Beaux-Arts (Escola de Belas Artes), continua a ser o modelo da arquitetura moderna em todo o mundo, inclusive no Brasil. A referência passa a ser a Paris do II Império.

Com a queda do neoclássico, entra em voga o estilo eclético, que se caracteriza pela liberdade de criação. No Rio de Janeiro, o melhor exemplo do ecletismo inspirado na arquitetura francesa revela-se no conjunto da Cinelândia, com a presença do Teatro Municipal e do Museu Nacional de Belas Artes, cuja fachada copia uma das frentes do museu do Louvre e da Biblioteca Nacional.

O centro de São Paulo fervilha com seus cafés, cinemas e lojas elegantes. Os bem-nascidos aspiram ter em sua cidade uma casa de ópera à altura do Garnier de Paris.

 

Teatro de São Paulo

 

Teatro de Paris

Em 12 de setembro de 1911, 20 mil pessoas se acotovelavam na praça Ramos de Azevedo para assistir à inauguração do Teatro Municipal de São Paulo.

O projeto se baseia no trabalho de Charles Garnier, o responsável pela construção da Ópera de Paris. Porém, a sua construção é realizada após um concurso público, que dá a Francisco de Oliveira Passos e ao francês Albert Guilbert a primeira colocação.

Na cidade de São Paulo, o Teatro Municipal é a miniatura do Opéra de Paris ou também chamado Théâtre Garnier.

É nesse contexto que, no dia 17 de março de 1900, onze industriais e banqueiros franceses fundam a Câmara de Comércio França – Brasil no Rio de Janeiro.

Em um ambiente de club d’affaires (Clube de Negócios), eles se reúnem para trocar informações sobre a dinâmica do mercado brasileiro.

Nesse momento de forte influência francesa, seja nas artes ou nos negócios, a gestão do prefeito Pereira Passos é marcada pela clara tentativa de transformar a aparência da cidade, inspirando-se nas reformas de Haussmann em Paris. No lugar de cortiços e ruas estreitas e escuras, surgem os “boulevars” com imponentes edifícios.

Diante desse crescimento, funda-se no Rio de Janeiro, em novembro de 1904, a Companhia de Seguros Terrestres e Marítimos Brasil, que conta com a participação minoritária da Compagnie d´Assurances  Générales de France.

Ao final da administração de Pereira Passos, o Rio de Janeiro torna-se um lugar salubre, moderno, arborizado e com vias asfaltadas. Em suas ruas largas começam a circular os bondes elétricos e os primeiros automóveis. A cidade recebe o título de Cidade Maravilhosa. O prefeito ergue uma nova metrópole com a ambição de se parecer com uma Paris dos trópicos.

É no país da Cidade Maravilhosa que uma invenção rejeitada pelos europeus será recebida de braços abertos pelos brasileiros. Trata-se do lança-perfume, a grande diversão dos foliões brasileiros.

Lança-perfume

Em 1909 são importadas 630mil unidades, representando mais de 16 toneladas de cloreto de etila.

No começo de 1914, proíbe-se o consumo do produto em terras brasileiras, embora a produção e a procura continuassem a crescer. Em março desse ano, a Société Chimique des Usines du Rhône (SCUR) futuramente chamada de Rhodia, resolve mandar ao Brasil uma missão técnica para estudar a implantação de uma filial no país.

O resultado é a compra por 50 mil francos, de um terreno de 44.000 metros quadrados, em São Bernardo -Estação, mais tarde emancipada e transformada em Santo André da Borda do Campo, no estado de São Paulo.

Rhodia em Santo André

A situação política europeia, no entanto, se agrava a cada dia, interrompendo bruscamente a continuidade do projeto. Com a guerra (1914-1918) se alastrando pelo continente, Paris não pensa mais na instalação da longínqua filial. O lança-perfume é deixado de lado até o armistício de 1918.

Feita a paz, retomam-se os antigos projetos.

No final de 1919, sob a direção de Henri Sannejouand, ativam-se os estudos para a instalação da unidade brasileira a ser construída no terreno adquirido em 1914.

Assim instala-se a unidade química de Santo André, transformando a Rhodia no primeiro investimento industrial francês no Brasil.

No dia 19 de dezembro de 1919, no Consulado Brasileiro em Paris, é fundada a Companhia Química Rhodia Brasileira.

O nome adotado para a nova empresa lembra bem a sua origem. Rhodia vem de “Rhodamus” ou “Rhône”, (Ródano em português) e remete ao endereço telegráfico das Usinas du Rhône na Suíça e na França.

O programa de trabalho prevê, em sua primeira etapa a fabricação de cloreto de etila, lança-perfume, ácido sulfúrico, ácido muriático, sulfato de sódio e gesso.

No mesmo mês, os responsáveis pela fábrica embarcaram no navio Asie, trazendo máquinas e ferramentas.

Os primeiros lança-perfumes nacionais comercializados no Carnaval de 1922, chegando a produzir 158 mil dúzias dois anos mais tarde.

A Rhodia inicia então sua brilhante trajetória no Brasil.

No Rio de Janeiro, nos anos 1920, a família Guinle, uma das mais tradicionais da cidade, ergue um hotel, famoso no mundo todo na época, o Copacabana Palace. Foi construído a pedido do presidente Epitácio Pessoa, tendo como arquiteto o francês Joseph Gire.

                      

Hotel Copacabana Palace

O deslumbrante hotel segue o estilo Louis XVI,  a inspiração da obra vem do hotel Negresco de Nice e do Carlton de Cannes.

Joseph Gire assina outros projetos como o primeiro arranha-céu da cidade, um prédio de 22 andares construído nos anos 1920.

Lições em dois idiomas

Para acompanhar os modos e costumes europeus, os filhos homens de barões do café e políticos de outras famílias de alto poder aquisitivo, são enviados para a Europa para estudar.

Já as moças, sob a rígida supervisão dos pais, não têm o direito de conhecer o mundo. Entretanto elas precisam ser bem-educadas. É assim que, após insistentes pedidos dos pais o Colégio Nossa Senhora de Sion, fundado em Paris no ano de 1854 por sacerdotes católicos, instala-se em São Paulo em 1901.

Nessa época a promissora São Paulo concentra uma população de pouco mais de 200 mil habitantes.

Preocupado com a educação local, o conselheiro Francisco de Paula Rodrigues Alves, então presidente da província, conhecedor da elegância das irmãs de Sion, torna-se protetor máximo da nova instituição.

Em 1901, as religiosas francesas chegam à atual estação Pedro II. Em pouco tempo, elas adquirem um casarão amplo onde funcionou um antigo sanatório. Embora careça de conforto, ele está situado em um ambiente bucólico, com ar puro, beleza natural e muita paz. Seu endereço é a avenida Higienópolis, cujo nome advém de “cidade da higiene”.

No dia 20 de fevereiro,180 alunas iniciam as atividades escolares no Sion, como é o caso das filhas mais jovens do presidente Rodrigues Alves e das herdeiras do diretor e fundador do jornal “O Estado de São Paulo”, Júlio de Mesquita.

O Colégio Sion funciona em sistema de internato e as estudantes são alfabetizadas em francês e português.

A riqueza do café é tamanha que o número de alunas cresce de forma surpreendente para atender o enorme número de matrículas, as irmãs decidem construir um novo e grande prédio para o colégio.

Colégio Sacré-Coeur

No Rio de Janeiro, as jovens da elite carioca, também têm acesso à educação francesa a partir de 1904, ano em que o Colégio Sacré-Coeur de Jesus (fundado no início do século XIX na cidade de Amiens, no norte da França, por Santa Madalena Sofia Barat, canonizada em 1925) inicia suas atividades.

A decisão de se instalar no Brasil, ocorre no início do século XX, quando o governo francês, positivista e maçônico, ordena o fechamento de todos os colégios católicos do país. É assim que as primeiras religiosas do Sacré-Coeur desembarcam na cidade. Sem falar uma única palavra em português, elas decidem dar continuidade às suas obras em lugar desconhecido, mas fortemente católico.

Com isso, as freiras compram um terreno para a construção do internato no Alto da Boa Vista, que abrigará cerca de 200 meninas, com idade entre 8 e 18 anos, filhas de fazendeiros e de famílias ricas do interior do país.

O modelo de ensino do Sacré -Coeur faz grande sucesso no Brasil. Afinal, trata-se de um colégio à frente de seu tempo, que usa, por exemplo, jornais durante a aula com o intuito de debater temas atuais.

Como se estudassem na terra de Napoleão, as alunas cantam, ao final das atividades anuais La Marseillaise, o hino nacional da França!

 

Nota: Como este assunto é vasto continuarei na próxima semana. Boa leitura!

Helena Landell

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